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Emitamos, sem medo, a nossa opinião. Como a imparcialidade é um mito, confessemos as nossas PARCIALIDADES.
Hoje, a desconfiança no jornalista é tema recorrente. As "fake news", redes sociais, interesses comerciais dos orgão de comunicação social, incompetência, manipulação, "encomendas". Vários são os motivos que levam a uma infeliz descrença em quem tem por missão reportar as notícias.
No caso, restrinjo essa (des)confiança a temas como o futebol e a política partidária. "Todos" querem saber qual o clube e partido dos jornalistas.
No futebol, um jornalista que tenha vocação e sensibilidade para a profissão - excluimos as pressões das administrações dos jornais - pouco lhe importa o clube que prefere quando está a trabalhar. Se está nos seus primeiros anos a noticiar, pode sentir desconforto, mas à medida que vai passando o tempo e chega a experiência, cria-se uma espécie de insensibilidade que permite noticiar sem sentimento. Claro, estou a falar de gente séria e não de jornalistas pagos para dizer mal deste ou daquele, o que esbarra no Código Deontológico; são mercenários da comunicação social e não quer saber da deontologia para nada. E são estes mercenários, que têm proliferado na última década, o cancro que mina um jornalismo ético, sério e digno. Depois, as televisões promovem uma confusão fatal: jornalista e comentador. O jornalista não devia embarcar nesta folia, mas o dinheiro fala mais alto e os mercenários não resistem.
Se o jornalista não pode dar opinião? Claro que pode! Quando escreve um artigo com esse fim. Mas nunca para fazer campanha contra ou a favor do clube x ou y. E o jornalista é suficientemente hábil com as palavras para opinar sem fazer campanha.
E uma verdade do senhor De La Palisse, quanto mais independente for o orgão de comunicação social, mas coerente é o discurso jornalístico. Na notícia, conta o que vê. Na reportagem, o que viu. Na crónica, o que sentiu e no artigo de opinião, o que pensa sobre o assunto.
Como profissional já escrevi e noticiei sobre os clubes da minha preferências e nunca fui censurado por estar a manipular ou a mentir. Como eu, centenas de camaradas. Fazíamos questão de trazer as notícias com a maior precisão possível. Fretes, campanhas e desinformação não eram para nós. Eram temas para os comentadores contratados, os chamados fazedores de opinião. E os jornalistas, enquanto exercem essa função devem abster-se de ir por esse caminho.
Com os partidos políticos, é semelhante. Não podemos esquecer que antes de sermos profissionais, já tínhamos clube e partido ou, pelo menos, simapatias por a ou b.
Mas na política tudo se torna mais fácil. Quando o jornalista escreve crónicas ou artigos, percebe-se, com clareza, se é conservador ou progressista. Não importa o partido, mas a matriz ideológica. O que nem sempre se descobre quando o discurso é sobre desporto.
O que se aplica no desporto, aplica-se na política. Independentemente da sua matriz ideológica, um profissional competente, quando noticia, quer fazê-lo bem, com clareza, entendível por toda a gente. Mas, os mercenários também andam por aqui. E a confusãos instala-se.
Cabe aos leitores apurarem a sua capacidade crítica, a literacia mediática, para separem o "trigo do jóio".
Porque o jornalismo com ética é fundamental para uma democracia pujante e um estado de direito promotor dos mesmos direitos e deveres para toda a gente.
Shereen é mais uma jornalista abatida por militares. De nacionalidade palestiniana e americana, acompanhava uma operação do exército israelita no campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia ocupada. Tratava-se de mais uma reportagem, entre as muitas que fazia, para o canal televisivo Al Jazeera. A morte foi causada por um tiro na cabeça. Além de ser muito conhecida quer por israelitas quer por palestinianos, usava capacete bem identificado e um colete "Press". As suas armas eram os olhos, ouvidos, bloco-notas, câmara de filmar e microfone. Perigosíssimas, pois, para os ditadores, expansionistas e colonizadores. Pessoas decentes, mesmo em guerra ( não era este o caso!), respeitam os jornalistas. Quando não querem que avancem, dizem. E os repórteres, habitualmente, respeitam.
A pressa do Primeiro Ministro de Israel vir a público afirmar que deveria ter sido atingida por fogo palestiniano, revela o carácter da figura. Político e pessoal. Sem avançar com qualquer tipo de investigação, o mais avisado seria aguardar e falar posteriormente. Para quê tanta rapidez? Dá que pensar.
Segundo a France-Press, não havia nas redondezas palestinianos armados. E os tiros mantiveram-se, já a jornalista estava por terra, durante mais algum tempo, disse a agência. Provavelmente, eram para "varrer" todos os que acompanhavam Shereen. Não podemos esquecer que a opinião pública da Palestina chamava-lhe " A Nossa Voz".
Os políticos e militares que não têm a consciência tranquila ou nem sequer consciência, apavoram-se com a verdade. O desaparecimento do mensageiro, apazigua-os. Num mundo em que o totalitarismo avança a todo o vapor, Putin vai deixando raízes em locais onde menos se espera, a Humanidade desumaniza-se rapidamente. E ninguém está seguro. Nem os jornalistas nem as populações em geral; quando se coloca, ainda, a dúvida se disparar deliberadamente contra cidadãos desarmados é ou não crime de guerra!! Vamos no mau caminho.
O avanço tecnológico está a ser inversamente proporcional ao humanismo. A liberdade de expressão, indispensável à democracia, é a primeira a ser destruída. Assim foi em todas as ditaduras. Tudo preparado, portanto, para a reescrição da História e a destruição da verdade...à lei da bala. Crápulas assassinos.
(Fotos: Al Jazeera e Sapo24)
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