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Assisti a um milagre a caminho de Santiago.

por Jorge Santos, em 15.09.22

caminho de santiago.jpg

  Os Caminhos de Santiago são, entre muitas coisas,  prova de superação individual. Caminhar diariamente, sempre mais do que duas dezenas de quilómetros, durante uma semana, cansa, dói, amassa o corpo todo, principalmente os pés. E não sendo  algo impossível, é difícil. A dificuldade e a dor são atenuados pela paisagem e pelo recolhimento interior; para outros, pela fé. É um exercício muito complexo de explicar. Tem de sentir-se.

No último que fiz, a minha companheira de Caminho passou por grandes dificuldades desde bastante cedo - demasiado cansaço, bolhas nos pés, unhas pisadas. E o desânimo que tudo isto provoca. Na etapa entre Caldas dos Reis e Pádron, com cerca de 25K, a penúltima desta iniciativa, fê-la pensar na desistência. Apesar de faltar só a ligação a Santiago de Compostela, com 24K, ficar a descansar em Padrón foi a primeira decisão. Mas alterou, pois o incentivo de todos, deu--lhe a força anímica necessária para iniciar. A custo, passada curta, dôr. Olhar pregado ao chão. Os bastões foram grande aliados nesta fase complicada.

Lentamente, à medida que íamos engolindo quilómetros, ela melhorava. As dores diminuiam. O cansaço  metia férias. Aos 16K, já era ela quem puxava por mim. Calor, sol entre nuvens que fere a pele, subidas e descidas íngremes em asfalto. Cada quilómetro ultrapassado, uma pequena vitória.  Quase hora de almoço. Convinha parar, abastecer e descansar um pouco. O local previsto para isso ficava, mais ou menos, ao 18K. Teríamos de percorrer mais dois, portanto.

 Pois aos 16K, como a senti muito mais fresca do que eu, disse-lhe para seguir no seu ritmo e guardar mesa, pois eu não conseguiria ir mais ligeiro. Aqueles dias todos a caminhar faziam mossa. Ela concordou. Aumentou a firmeza da passada; eu fiquei para trás.

 E foi ai que o milagre aconteceu! A sua firmeza no passo, passou a ritmo de corrida. Parei, abri instintivamente a boca  de pasmo. A minha companheira de Caminho, que tão mal passou deste tão cedo, chegou a equacionar até a desistência, avançava a trote. Numa estrada que subia, calor, mochila às costas, bastões nas mãos. Assim foi, a correr!, até ao restaurante . Quando lá cheguei, encontrei-a já sentada, ar feliz, confiante. Motivação, bem-estar. "Não tenho dores  e, se fosse preciso, fazia os restantes 8K a correr". - disse-me, quando, exausto, ocupei a cadeira em frente à sua, na mesa do restaurante.

 A companheira de Caminho é praticante de atletismo ( corridas de fundo), mas estava literalmente "ko". Seria impensável correr naquelas condições, já tendo percorrido 16K. Mas correu. E chegou à "Obradoiro", em Santiago,sem dores. " Não me dói nada" - disse-me em frente à Catedral.

 Quando vierem dizer-me que os milagres não existem, eu negarei. Este eu vi. Estava lá! Porque, caros amigos, só pode ter sido milagre. Para os céticos (como eu) é um choque. Mas ainda bem. Se há milagres, que aconteçam muitas e mais vezes. Precisamos muito, mas muito, deles. Ultreia et Suseia.

 

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publicado às 20:44


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